sábado, 19 de maio de 2007

Um jeito mexicano de ser:
O México está na moda. O lançamento da versão hollywoodiana de Frida Khalo no cinema, vivida pela atriz Salma Hayek, a participação de Caetano Veloso no filme cantando Burn it Blue ou com Lila Downs dão um pouco a medida desta moda.
Há um mês atrás a TV Cultura de São Paulo exibiu uma semana de programas sobre o México, incluídas pérolas e documentários sobre Octavio Paz, sobre pintura mexicana e culturas mayas. No fim de semana passado, no sábado de Páscoa, a TV Cultura exibiu no programa Perfiles de Nuestra América, uma entrevista com Chavela Vargas. E People & Arts exibiu, também no sábado, um depois do outro, documentários sobre Frida Khalo e Chavela Vargas. Também já foi anunciada para a próxima Bienal de Porto Alegre a vinda da obra do muralista José Clemente Orozco. Assim que, para quem quer conhecer as boas manifestações culturais do México, são tempos fartos.
Mas chama a atenção que os nomes mais importantes da cultura mexicana do século XX não sejam mexicanos nativos, nascidos no México. O escritor Carlos Fuentes é panamenho, a cantora -última das divas - Chavela Vargas, é da Costa Rica, a fotógrafa Tina Modotti é italiana e a premiadíssima Elena Poniatowska é francesa. Poniatowska já declarou em entrevista que sua forma de agradecer tudo o que o povo e a cultura mexicana lhe deram seria escrever sobre o povo mexicano, e quem conhece sabe, tanto a personagem de Jesusa Palancares em Hasta no verte Jesús Mío, uma soldadera da Revolução Mexicana, como seus relatos sobre o massacre na Plaza de Tlatelolco, em 1968 dão testemunho do cumprimento desta promessa. Chavela Vargas diz que o México lhe deu tudo, foi seu pai e sua mãe, lhe ensinou a cantar e a ter um ofício, uma carreira.
O fascínio exercido pelas promessas da Revolução Mexicana, promessas de um mundo melhor, mais justo, capitalizaram a vinda de milhares de imigrantes europeus que fugiam da guerra e aportavam no México em busca de uma vida melhor.
Mas, além das circunstâncias históricas, e olhando para os personagens em questão, os expoentes da cultura mexicana que não são mexicanos, não posso deixar de pensar que, antes de mais nada o México nos possibilita um jeito mexicano de ser. Ou, dito de outra maneira, os que teriam um jeito mexicano de ser, filiam-se imediatamente a esta cultura e suas possibilidades de expressão. E que jeito seria este? Ainda que Octavio Paz em seu clássico texto Máscaras Mexicanas atribua uma certa timidez e recato ao mexicano, não podemos deixar de pensar em sua intensidade, seu exagero, sua dramaticidade. Quem vê Chavela Vargas cantando e conhece sua biografia, a de uma mulher que andou muitos anos armada e que canta como que realiza um verdadeiro ritual, sabe do que se trata.
Atílio Borón, o conhecido cientista político argentino, já dizia que se o México não estivesse entre os Estados Unidos e a América Latina, nós já teríamos sido esmagados culturalmente, muito mais do que já fomos, que a solidez da cultura mexicana serviu de anteparo, escudo, proteção entre os norte-americanos e os latino-americanos.
Mas, muito além dos estereótipos, a consistência e a multiplicidade da cultura mexicana parecem fornecer formas expressivas ricas e inesgotáveis ao longo dos tempos. Tudo é grande, exagerado e colorido no México, musical, dramático, trágico e bem humorado.
Chavela Vargas filiou-se à cultura mexicana , Carlos Fuentes, Elena Poniatowska também, Caetano Veloso, que cantou desde sempre boleros e canções mexicanas, e Pedro Almodóvar, que aparece como um expoente importante no diálogo entre Espanha e o México.
Os que temos um jeito mexicano de ser, exagerado, sentimental, cheio de cores, intenso e alegre, trágico e bem humorado, dramático e tristíssimo, temos o México como território a ser explorado, conhecido, reconhecido. A moda mexicana vem para nos enriquecer, uma bênção, para lembrar do sonho esquecido de que somos latino-americanos e que alguns de nossos sonhos ainda se parecem muito e nos irmanam.
Lélia Almeida

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