domingo, 23 de maio de 2010

Falas finais do filme Fanny e Alexander, de Ingmar Bergman, de 1982.

(em homenagem a Clarisse Blauth, que gosta do filme tanto como eu)

(...) Meus caríssimos amigos! Estou muito emocionado. Sei que muitos condenam a minha simples filosofia. Que se dane! Desculpa, mãe, serei breve. Os Ekdahl não nasceram para decifrar segredos. Não estamos habilitados para isto. Esqueçam isto. Vivemos no pequeno mundo e façamos o melhor dele. Tiremos o melhor partido. De repente, vem a morte, o abismo sobre nossos pés, somos vítimas de tempestades e catástrofes. Sabemos disto, mas evitamos pensar nisso. Nós, Ekdahl, amamos a nossa ilusão. Tire a ilusão de um homem e ele é um tolo, morto de tédio. Precisamos compreender as pessoas ou não as poderemos amar, e as criticaremos. É preciso compreende a realidade, o mundo. E, em plena consciência, poderemos criticar e deplorar a sua absurda monotonia. Nada de tristeza, caros artistas e atrizes! Precisamos de vocês! Uma necessidade sagrada! São vocês que acordam nossa imaginação! Vocês nos dão nossos arrepios e distrações! O mundo é um covil e, logo, a noite nos engolirá. As hordas do mal nos cercam. O veneno penetra em nós, os Ekdahl, e em todos, não poupa ninguém. Nem Helena Victoria, nem a pequena Aurora. Mas tudo passará. Portanto aproveitemos quando estamos felizes. Sejamos bons, gentis, generosos! Devemos nos alegrar sem remorso. Não é vergonha alegrar-se pelo pequeno mundo. A boa comida, um sorriso, árvores, frutas, valsas. Agora, terminei. Entendam como quiserem. Divagações ou caduqices, pouco me importa! Tenho aqui uma pequena imperatriz. É concebível e também incomensurável. Um dia provará que estou errado e reinará, não só sobre o pequeno mundo, mas sobre tudo.

(...) Mentira e realidade são uma. Tudo pode acontecer. Tudo é sonho e verdade. Tempo e espaço não existem. Sobre a frágil base da realidade a imaginação tece sua teia e desenha novas formas, novos destinos.” In: O Sonho, de August Strindberg.