domingo, 9 de junho de 2013

A bruxa, por Lélia Almeida:


O João Francisco está louco por mim. Pensar nisto me anima a vida. Vou dormir pensando nisto, acordo pensando nisto, que o João Francisco me ama, me quer, me adora. Convidou-me pra sair na sexta e eu disse que só posso no sábado, pra fazer um charminho, é claro, pra não dar muito mole. Ligo pra Marcela pra contar, ela diz que mereço, que é mérito meu ter conquistado aquele gato, lindo, rico, carrão, e ligo pra Fer e pra Helô. Todas felizes por mim, poderosa você, amiga! Uma sombra entra no quarto. Não, não é uma sombra. É ela, a Basília, que tem o dom de acabar com a minha alegria. Nunca gostei desta negra, penso. Minha mãe me proibiu de falar assim, mas eu sei o tanto que não a suporto e acabou. Não gosto do olhar dela, que parece que olha dentro de mim, nem da cara séria, ela que tem quase a minha idade e parece uma velha. Ela espana os livros e eu volto para o sol, para as risadas com as minhas amigas. Ele tá louco por mim, o João Francisco, eu repito. João Francisco me ama e a vida é boa. E vou ao salão no sábado, vou arrumar o cabelo, fazer a mão, o pé, e ficar linda para o João Francisco. Volto a elas, ele tá caidinho por mim, tá de quatro, tá louquinho por mim. E a sombra se projeta e se afasta como se o quarto estivesse sob as asas de uma borboleta de asas negra, uma bruxa. Uma irritação imensa vai tomando conta de mim. Viro-me pra ela, esta Basília que nunca vai saber o que é ter um homem do nível do João Francisco aos seus pés e não aguento: – Qual é o seu problema, nunca viu uma mulher feliz, sua idiota? O João Francisco tá louco por mim, eu encho a boca os pulmões, dona do mundo, dona do João Francisco e esta negra horrorosa, metida, que não pode ficar quieta e engolir a língua, desagradável, e que olha nos meus olhos, e faz a pergunta, a única que não precisava fazer, a infeliz, invejosa, a estraga prazeres: - E você? Você por acaso é louca por este João Francisco?

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